segunda-feira, fevereiro 06, 2006

Um ensaiozinho

“Na Bahia não se nasce, estréia!”. Quantas vezes você já ouviu essa frase? Muitas aposto. Mas sabe o que acho dela? Uma verdadeira falácia! E vou explicar porque. A atual forma como a cultura vem sendo conduzida no nosso estado, mais especificamente em Salvador, só confirma que essa não passa de mais uma mentira velada e que há bastante tempo é empurrada na cabeça dos turistas e dos próprios soteropolitanos.

O ato da estréia, no sentido da famosa frase, significa que todo baiano nasce para o meio artístico. Como se os primeiros berros infantis soassem de forma cadenciada, indicando uma evidência musical ou as necessidades fisiológicas liberadas na cara do médico pelo bebê, ao nascer, mostrassem uma predisposição a um humor crônico, praticamente implícito ao nosso ser. Afinal, baiano que é baiano não tem mau humor, adora pagode, carnaval, acarajé, freqüenta terreiro de macumba e para completar é preguiçoso pra caralho, tudo exatamente nessa ordem.

Esta frase, muito utilizada pela mídia externa e confirmada por pseudo-artistas, que se dizem representantes da Bahia, tenta mascarar o funcionamento verdadeiro da “estréia” baiana. Para nós, baianos-que não necessariamente gostamos ao mesmo tempo de pagode, carnaval, acarajé e não freqüentamos terreiro de macumba - e que acompanhamos de perto o nascimento das manifestações culturais aqui na cidade, sabemos que os espetáculos não surgem de forma assim, tão espontânea nas maternidades Climério de Oliveira ou Ticyla Balbino.

Os espaços são bem menos democráticos. Hoje, para se assistir a uma estréia de um baiano, é necessário juntar-se com uns amigos e comprar uma “casadinha”, ou então gastar um valor referente à metade do salário mínimo indo para um camarote de área VIP com as mais variadas cores de camisas. Quando não, pagar R$60,00 para assistir um espetáculo no TCA-um teatro mantido com recursos governamentais, que por sua vez, se mantêm com recursos de impostos, que nós- baianos que estreamos- pagamos nas contas.

Ostentamos a arrogância de pertencemos a um Estado, que todos afirmam possuir características absolutamente peculiares. Em certa medida eu até concordo, temos características próprias, assim como qualquer lugar do Brasil ou do mundo. Nenhum lugar é igual ao outro. O que não concordo é que façamos dessas singularidades um pedestal que nos deixem cego para a verdadeira realidade que nos cerca. Pois, não percebamos-ou não nos deixam perceber (Emtursas, Bahiatursas, Propegs)-o quanto estamos sendo demasiadamente levianos em exaltar uma cultura que o povão não conhece.

Temos uma política cultural verdadeiramente escrota. Que pisa nas companhias populares e de raiz e promove porcarias. Os teatros alternativos são largados ao léu e a boa vontade da “responsabilidade social” das empresas. Tiram leite de pedra todos os meses, para manterem o acesso à cultura- que é um direito constitucional- a todos. Enquanto meia dúzia de artistas monopolizam circuitos-musical, teatral...- “sugando” todos os patrocínios e atenção da mídia.

Nós - baianos também, mas que estamos longe dessa famosa estréia-aguardamos o dia em que alguns dos irmãos Rangel ou a DM9 venha “marketizar” o nascimento da estréia digna, de um baiano que se preza. Enquanto isso... Vamos por aqui ouvindo piadinhas e fazendo a “baianada” (gíria que os simpáticos paulistas nos atribuíram), de acreditar que somos o estado da diversidade.

2 Comments:

At 2:49 AM, Anonymous Anônimo said...

APLAUSOS!!!

MUITO BOM!
IRônico, sarcástico e refinAdo...
parabéns!

 
At 12:03 PM, Anonymous Anônimo said...

Muito bom seu texto viu amiga... Parabéns.. beijosss

 

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